quarta-feira, 31 de março de 2010

Por que me tornei vegetariana


Sempre desprezei qualquer tipo de fanatismo.
Pessoas obcecadas tentando convencer os outros de seus ideais e crenças. Não tem coisa mais chata.
Optei pelo vegetarianismo. Não por modismo, nem por fazer o conveniente na minha profissão: professores de yoga não vegetarianos sempre foram mal vistos.


Na filosofia Yogi, ja ouvi muitas vezes que não comer carne era um meio de purificação, capaz de levar o praticante a estados mais profundos de consciência, facilitando a meditação.
Além disso, o praticante estaria cumprindo um dos Yamas, (normas de convivência, que estão no segundo capítulo do Yoga Sutra de Patañjali, um famoso filósofo hindu), que é o Ahimsa, ou não-agressão. Estaríamos indo contra esse princípio agredindo os animais para consumí-los.
Mas isso não me convencia. Muitas pessoas que se diziam vegetarianas, consequentemente 'purificadas, elevadas espiritualmente', eram extremamente egocêntricas, e criticavam fervorosamente quem comia carne.
Então eu percebia claramente que o não comer carne não tornava a pessoa mais espiritualizada. Essas pessoas se esqueciam dos outros Yamas, como a autenticidade [satya], ou a prática de uma vida espiritualmente regrada [bráhmacarya], por exemplo. 
Mas mesmo assim resolvi experimentar, e fiquei um tempo não comendo nenhum tipo de carne, para ver se fazia alguma diferença. Não me senti "superior" nem mais espiritualizada nesse período.
Acabei descontando nos doces e engordei. Além disso, eu ainda sentia vontade de comer carne, então acabei desistindo.
Os benefícios que percebi foi que minha digestão e a disposição física melhoraram, resultando em um maior rendimento nas práticas de Yoga.


Anos depois, mesmo sabendo dos prejuízos que o consumo de carne trazia para o meio-ambiente e dos maus tratos sofridos pelos animais, ainda assim sentia vontade de comer carne, mas já estava convencida que eu precisava me tornar vegetariana. Essa sim era uma causa nobre e correta.
Nunca fui de comer carne demais, e procurei diminuir mais ainda.
Mas só diminuir não bastava para mim.


Então aconteceu uma coisa que me ajudou a parar de vez.
Eu e meu marido começamos a sentir um cheiro de podre vindo do lado de fora da nossa casa. Quando vimos, tinha um pombo morto no beiral do telhado, e lá de cima, centenas de larvas caíam no piso de trás da casa. Elas se arrastavam levando um fedor horrível com elas. E de repente me senti como a larva. Comer carne não me tornava diferente. Também levava no meu corpo carne em decomposição. Achei aquilo tudo tão nojento que não consegui mais pensar em colocar carne na boca.


Desde então comecei a pesquisar mais sobre o vegetarianismo.
Quando a gente faz uma coisa e sabe que está errada, fechamos os olhos para não ver a realidade.
Quando abri os meus o que percebi foi o quanto eu estava sendo egoísta com os animais, com as pessoas e com o mundo.
Tanto se fala em diminuir o consumo de água. Vemos todos os dias propagandas pedindo para que tomamos banhos mais curtos e mais aquele bla bla bla todo. O que essas propagandas não contam é que para ser produzido 1 kg de carne, por exemplo, são gastos 15.000 litros de água. Para o mesmo quilo de cereal seriam gastos apenas 1.300 litros.
Sem contar que se os cereais que são liberados para alimentar o gado na pecuária fosse revertido para as pessoas, não existiria mais fome no mundo.
Então estaríamos deixando de alimentar pessoas pobres para satisfazer nossa gula, alimentando um animal para depois nos alimentarmos dele?
Então me pergunto, quem somos nós?
Na revista Galileu desse mês li um artigo sobre o livro "Eating Animals", do americano Jonathan Safran Foer.
Segue alguns trechos:


- "Sem piadas aqui, e sem desviar do assunto: os animais são sangrados, pelados e desmembrados enquanto estão conscientes. Isso acontece o tempo todo, e a indústria e o governo americano sabem disso."


- "A próxima vez que um amigo tiver um 'resfriado' repentino, faça algumas perguntas. A doença foi uma dessas que vêm e vão rápido - vomitadas ou defecadas e então aliviadas? O diagnóstico não é simples, mas, se a resposta for sim, seu amigo provavelmente não 'pegou uma virose', ele 'comeu uma virose'..."


- "Comemos animais doentes. Frangos e perus são criados em espaços minúsculos, sem a mínima condição de locomoção. Porcos nascem deformados e precisam ficar presos para não atacarem uns aos outros. Peixes criados em tanques podem tornar-se canibais. Grande parte do gado é retalhada e desmembrada enquanto ainda está consciente. Nosso sustento vem da miséria. Se alguém nos oferecer um filme sobre como nossa carne é produzida, ele será de terror."


- "Os animais criados nas fazendas industriais produzem 130 vezes mais excrementos que a população humana - nos EUA, são cerca de 40 mil quilos de merda por segundo."


- "Quanto mais cedo os leitões se alimentam de sólidos, mais cedo alcançam o peso de mercado. 'Comida sólida' frequentemente inclui plasma sanguíneo seco, um produto secundário dos abatedouros. Depois os porcos vão para gaiolas de metal. Essas gaiolas são empilhadas, fezes e urina caem das gaiolas superiores nos animais de baixo..."


-"Sou contra o argumento de que comer carne é da natureza humana. O progresso só se dá quando transcendermos a natureza. Afinal existiram épocas e lugares em que os humanos comeram insetos, bichos de estimação ou outros humanos. As pessoas precisam comer de acordo com seus valores. Se fizessem isso, a maioria deixaria de comer carne."


 - "Por tudo isso, tornei-me vegetariano e escolhi alimentar meu filho da mesma forma. O vegetarianismo é a única forma de comer coerente com tudo que mais ensino a ele. Não consigo lhe dizer 'olha meu filho, sabe aqueles animaizinhos que estão nos livros que lemos pra você à noite? Então, na verdade, a gente mata todos eles, arranca a cabeça, coloca na churrasqueira e depois come, viu?' Não falo de certo e errado, mas simplesmente não tem nada a ver com meus valores."


Respeito quem come carne. Mas as pessoas tem que se informar mais sobre o que andam comendo. É preciso uma consciência ecológica. É muito bonito dizer nos dias de hoje que se é ecologicamente correto, que o lixo é separado e que as sacolas plásticas tem que acabar. Alegam que as mesmas quando lançadas nos rios e oceanos matam peixes e outros animais que sufocam com elas. Estranho essas mesmas pessoas comerem esses animais.
Mais estranho são as pessoas fazerem tanto barulho pelo mico-leão-dourado, arara azul ou outros animais em extinção. Será que elas não percebem que mais um pouco somos nós, seres humanos que entraremos para lista por falta de ter o que comer?
Não é pelo YOGA que deixei de comer carne.
É pelo futuro da minha filha, dos meus netos  e do planeta.
É pelo fim do sofrimento desses animais.
Minha saúde agradece!


By Nina





. A indústria de carne é responsável por 18% das emissões globais de gases causadores do efeito estufa, ao passo que todos os transportes somados geram 13%.(1).
. A pecuária gera diretamente 80% do desmatamento no bioma amazônico (2) e 14% em todo o mundo.
. Somos quase 7 bilhões de pessoas na Terra e criamos, para produzir carne, mais de 30 bilhões de animais (3) que consomem água, comida e recursos energéticos, demandam espaço, despejam detritos, contaminam os mananciais, causam erosão e geram poluição atmosférica.
. A criação de animais para abate é uma forma ineficiente de produzir alimentos: para cada quilo de proteína animal são necessários de 3 a 10 kg de proteína vegetal (milho, soja etc.) (4).
_________
(1) FAO (2009)
(2) Ministério da Agricultura
(3) Incluindo aves, peixes, camarões e moluscos
(4) FAO (2005)



Abaixo o filme A CARNE É FRACA:

3 comentários:

  1. Nina (ou Carolina, nao sei como me referir),
    encontrei o seu blog (mais precisamente esse post) no site Guia Vegano. Estou mudando também minha alimentação, há alguns meses decidi parar de comer carne, frango e no ultimo mês parei também com os peixes (achei que seria mais facil a adaptação, já que como você eu tentei antes parar de comer carne e não tinha obtido êxito), para depois virar vegana. Adorei o post e os trechos da reportagem, ótimos argumentos. Vi que você é professora de Yoga, no RJ né? Faço Yoga em casa, comprei dvds e faço a prática sozinha, simultaneamente é claro de infindáveis pesquisas na internet. Moro em Recife-PE e ainda não encontrei um centro de Yoga que me agradasse.. Gostaria de saber se você, como professora, tem algumas dicas..

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  2. Oi Cá, que bom que vc gostou. Não adianta a gente forçar mudar a alimentação, é uma coisa que acontece naturalmente. Eu moro em SP. Vou dar uma pesquisada de onde existe um lugar legal pra vc praticar aí. Aqui na nossa escola de yoga meu marido da cursos a distância de formação profissional. Tem um ótimo material didático vinculado ao Centro de Estudos Yoga Natarája.
    Posso tb te indicar livros, me adicione no msn: bynina@hotmail.com

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  3. Lindo post e ótimos argumentos! Tbm não como carne e tenho a mesma consciência que vc, acontece naturalmente!

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Obrigada pela visita!

Nina

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Obrigada pela compreensão!

Carolina Carvalho
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